quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Lojas adotam a lógica das ações nos preços

Cada vez mais varejistas adotam a lógica do mercado de ações para mudar seus preços de acordo com a demanda. Em um só dia, a variação pode chegar a 50%

Michele Loureiro, de
Spencer Platt/Getty Images
Loja da Best Buy nos Estados Unidos
Loja da Best Buy nos Estados Unidos: novos preços a cada 15 minutos

São Paulo - Os clientes mais atentos da Livraria Cultura vêm percebendo uma dinâmica diferente nos preços dos 4,5 milhões de produtos vendidos no site da empresa. Até pouco tempo atrás, os valores cobrados pelos itens eram os mesmos das lojas físicas. Agora, eles sobem e descem em intervalos de tempo cada vez mais curtos, às vezes de hora em hora. Um livro que no começo do dia é vendido por 30 reais pode terminar custando 25 ou 35 reais, por exemplo.

As mudanças são resultado de uma nova política de precificação da empresa, que passou a ser estudada há dois anos. A equação tradicional de cálculo do preço — custo mais margem — foi engavetada. Agora, entram na conta variáveis como preço do mesmo produto na concorrência, estoque e demanda. “Tudo é feito de forma automática. Há um piso e um teto para cada produto, mas as variações são definidas por um software”, diz Thomaz Yazima, sócio da consultoria Intelectas, especializada em precificação, que desenhou o projeto para a Cultura (procurada, a livraria não concedeu entrevista). 
 
Embora seja novidade no Brasil, a estratégia de variar os preços ao longo do dia de acordo com a oferta e a demanda tem até nome: precificação dinâmica. A prática começou em 2008 nos Estados Unidos, em sites de varejistas como Amazon e Best Buy, e vem se popularizando.

Em vez de calcular os preços apenas com base no custo dos produtos, essas varejistas utilizam soft­wares que monitoram a voracidade dos clientes e as promoções da concorrência. Em alguns casos, alteram os valores a cada 15 minutos. É a chegada ao varejo de uma lógica usada há décadas para comprar e vender ações — quanto mais pessoas estão interessadas em um produto, maior é o valor cobrado por ele. 

É o tipo de inovação que não poderia existir sem a internet e a transformação que o comércio eletrônico causou na cabeça do consumidor. No Dia das Crianças, por exemplo, esse sistema de algoritmos identifica a mudança de preços da concorrência e começa a revisar os valores em uma disputa que chega a centavos — tudo para aparecer entre os mais baixos em sites especializados em comparação, como o decide.com, responsáveis por 50% do tráfego das grandes lojas americanas de comércio eletrônico.

Os preços de três dos aparelhos mais vendidos por Amazon e Best Buy variaram até 32% entre 1º e 3 de fevereiro. Uma televisão de 42 polegadas da Panasonic chegou a custar 799,99 dólares e caiu para 599,99 dólares. Em datas como a Black Friday, tradicional dia de liquidações, a flutuação dos preços é ainda mais nítida e pode chegar a 50% em um dia. “Para o consumidor, é uma dinâmica nova. Se você não ficou satisfeito com o preço, espere meia hora, e o cenário provavelmente terá mudado”, diz Manuel Osorio, sócio da Simon-Kucher, consultoria global de precificação com 25 escritórios no mundo.
O Buscapé, maior site de comparação de preços do Brasil, precisou reforçar sua equipe. Como o principal objetivo do site é mostrar os valores mais recentes disponíveis para os diversos produtos, a equipe responsável pela atualização de preços cresceu 35% desde 2011, para 100 pessoas.

“Monitoramos 60 000 lojas online e 15 milhões de ofertas. As atualizações, que antes eram diárias, agora chegam a acontecer de 15 em 15 minutos em datas comemorativas, como o Natal”, diz Rodrigo Borer, vice-presidente de comparação de preços do Buscapé. A flutuação de preços está mudando o hábito dos varejistas, que são obrigados eles mesmos a pesquisar a cada minuto os preços da concorrência. Há seis meses, o Buscapé montou um serviço de monitoramento de preços do mercado que é vendido para as grandes varejistas do país.
 
Exemplo na aviação

Embora seja novidade para os varejistas, a lógica da mudança automática de preços já é utilizada há pelo menos três décadas pelas companhias aéreas. Fatores como antecedência, horário do voo e previsão de demanda formam dezenas de tarifas para o mesmo voo. A variação entre o maior e o menor preço pode chegar a 500%. Mas adaptar essa estratégia para o varejo exige alguns cuidados. Na aviação, os assentos precisam ser vendidos até o horário de embarque — o que ficar vazio é prejuízo certo. No varejo, essa lógica não vale.

Quando um produto acaba, pode ser reposto. Quando não é vendido, pode ficar para o dia seguinte. Na ânsia de atrair consumidores, as lojas virtuais correm o risco de ignorar essa enorme diferença — e perder dinheiro. Para varejistas que vendem pela internet e também em lojas físicas, o maior risco é que preços muito baixos na web afugentem os consumidores das lojas. Mas, quando benfeita, a gestão dinâmica de preços pode aumentar os lucros de uma empresa em até 33%, de acordo com a Simon-Kucher. A dança dos preços, aparentemente, está apenas começando.

Fonte: http://exame.abril.com.br/revista-exame/edicoes/1035/noticias/a-danca-dos-precos-no-varejo?page=2

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